O Porto de Santos, entendido como complexo portuário que inclui instalações portuárias e retroportuárias nas cidades de Santos, Guarujá e Cubatão, já dispõe de quatro modos de transporte: rodoviário, ferroviário, aquaviário e dutoviário.
Considerando a situação atual e o potencial de expansão de atividades inerentes ao complexo portuário, a matriz de transportes existente preocupa, lembrando que a maioria absoluta das cargas operadas no porto não tem como origem ou destino a Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS).
Não à toa, desde há muito tempo, grupos vêm defendendo a construção de novos acessos rodoferroviários entre a RMBS e o planalto. Nesse caso, as soluções técnicas são o menor dos problemas. Os recursos financeiros também não seriam, em tese, uma dificuldade insuperável. A maior impedância, sem dúvida, está nos licenciamentos ambientais, em função das restrições legais existentes. Aqui, como em todo o país, esse tem sido o principal entrave à implantação de infraestrutura de transportes, fundamental para o desenvolvimento sustentado o Brasil.
Também há os que defendem o transporte hidroviário de cargas, aproveitando as vias navegáveis da região, mas ele somente será viável no caso da existência de produção local. Além disso, também haverá empecilhos no que se refere a licenciamentos ambientais para dragagens de aprofundamento e retificação de cursos d’água. A “Hidrovia do Sal”, proposta de ligação entre o complexo portuário e a unidade industrial da Unipar, em Cubatão, até hoje não foi viabilizada, apesar de potencializar a substituição de 60 mil viagens anuais de caminhões por um transporte de melhor eficiência energética, reduzindo a emissão de poluentes e o trânsito nas rodovias.
Mesmo assim, há as limitações de navegação impostas por pontes e dutos. Para adequá-los ao gabarito hidroviário mínimo, seriam necessárias obras de alteamento que impactariam nas margens, além da alteração de seu sistema estrutural. Enfim, seria necessário corrigir uma falta de visão estratégica de décadas.
O Governo Federal pretende fomentar o transporte hidroviário no país, mas não consta que a RMBS esteja nesse escopo, ao menos por ora.
No evento de lançamento da Consulta Pública relativa ao túnel Santos-Guarujá, ocorrido em 13/03/2024, o Ministro da Casa Civil, Rui Costa, enfatizou essa problemática relatando sua experiência como Governador da Bahia, quando precisou explicar a um investidor estrangeiro a instabilidade regulatória e jurídica que reina no âmbito dos licenciamentos ambientais, em nosso país.
Nada impede que tanto as demandas de acessos terrestres como aquaviários sejam equacionadas, aqui e no Brasil, desde que haja uma revisão da legislação ambiental atual que assimile que desenvolvimento sustentado é o equilíbrio entre aspectos ambientais, sociais e econômicos, associados a uma visão estratégica, de Estado.
Até aqui, foi abordada a questão dos acessos terrestres entre as áreas produtivas e o complexo portuário, e a submissão do transporte hidroviário local à produção na região.
Produção local...
Bem, aí entra a proposta de criação de uma Zona de Processamento de Exportação (ZPE) na área continental de Santos, com potencial para que outros municípios da RMBS se integrem ao complexo, respeitando o distanciamento máximo de 30 km entre terrenos.
Estudo e atuo, como pesquisador e servidor público, para viabilizar essa proposta, sendo que em 2017, em consulta que fiz ao Conselho Nacional de Zonas de Processamento de Exportação (CZPE), a cidade de Santos foi considerada apta a sediar uma ZPE, condição mantida até hoje, agora objeto de estudo de viabilidade econômica pela INFRA S.A.
Um ZPE está perfeitamente alinhada com a proposta de reindustrialização do Brasil, com foco em pesquisa e desenvolvimento tecnológico (P&D).
A atualização da legislação de ZPE feita em 2021, retirou a restrição de que 80% da produção deveria ser destinada à exportação, o que contribuirá tanto para a competitividade no mercado externo - com os incentivos previstos nesse regime -, como para o abastecimento do mercado interno, mantido o sistema tributário convencional.
Já deveriam existir várias ZPEs no Brasil, como existem mais de 7,5 mil Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) no mundo, mais de 2,5 mil só na China. Porém, aqui existem cerca de 16 autorizadas, das quais duas operacionais e 5 em processo efetivo de implantação, ao que consta. Houve mais autorizações, desde o início do regime de ZPE, mas muitas caducaram.
Várias Frentes Parlamentares têm sido criadas, com destaque para a Frente Parlamentar Mista da Ligação Seca Santos-Guarujá.
Creio que o momento é ideal para a criação de uma Frente Parlamentar de Fomento às Zonas de Processamento de Exportação, que atue para que a legislação pertinente incentive mais ainda a criação de ZPEs nas proximidades de portos e aeroportos, reduzindo custos logísticos, produzindo cargas de alto valor agregado, alta tecnologia e baixo impacto ambiental, e contribuindo para reduzir a dependência das exportações do agronegócio e das importações de produtos industrializados.
É importante lembrar que a recém-aprovada Reforma Tributária pode implicar em impactos negativos nos orçamentos municipais. No caso de Santos, a implantação de atividades industriais permitiria compensar eventuais perdas, por se tratar de nova atividade econômica, além de gerar empregos e incrementar o setor de serviços.
Também é importante salientar que a produção industrial, com ênfase em cargas de projeto e acondicionáveis em contêineres (ou contentores, como queiram) é menos suscetível a fatores climáticos do que granéis sólidos, base do agronegócio.
Recente relatório da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) concluiu que os efeitos das mudanças climáticas tendem a afetar certas operações portuárias.
Proximidade de aeroportos...
Uma ZPE implantada na área continental de Santos, próxima a terminais portuários públicos e privados, será um inegável trunfo logístico, além de contribuir para a geração de empregos qualificados e iniciativas de P&D. A Fundação Parque Tecnológico de Santos, as Instituições de Ensino Superior e Escolas Técnicas da RMBS têm condições de gerar e aperfeiçoar profissionais com múltiplas competências, além de atuar na transferência de tecnologia, na produção científica e, quem sabe, no registro de patentes.
Desde que surgiu a proposta de implantação do Aeroporto Civil Metropolitano em Guarujá, eu considerei seu potencial para a exportação de cargas de maior valor agregado. Recente matéria jornalística confirmou essa intenção, por parte da Prefeitura de Guarujá.
Mais um trunfo logístico que favorece à implantação de porto-indústria, ou porto-aeroporto-indústria, ampliando o espectro da expressão.
Ligação seca, porto-indústria (com a variante ZPE e a potencial vitalização do transporte hidroviário de cargas), aeroporto regional...
Há uma convergência para que a RMBS passe a contar com todos os modos de transportes existentes, cada um com sua vocação, potencializando o incremento do desenvolvimento sustentado regional, estadual e nacional, lembrando que pelo Porto de Santos circula cerca de 30% da corrente comercial do Brasil.
Por fim, é notável que o Porto de Santos venha batendo recordes de movimentação de cargas, mas é fundamental que essa pujança seja acompanhada de incremento do valor por tonelada.
Adilson Luiz Gonçalves - Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras.
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Foto: Divulgação Ilustartiva
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